terça-feira, 10 de julho de 2012

Sob o céu de Saigon (Caio Fernando Abreu)

Ele olhou para ela e ela olhou para ele.
Ele sorriu para ela, sem ter o que dizer. Ela também sorriu para ele.
Mas disse, a moça disse:― Parece Saigon, não?
― O quê?
― ele perguntou sem entender. Ela apontou para cima:
― O céu. O céu parece Saigon. Surpreso, e meio bobo, ele perguntou:
― E você já esteve em Saigon?
― Nunca
― ela sorriu outra vez. ―
Mas não é preciso.
Deve ser bem assim, você não acha?
― O quê?
― ele, que era meio lento, tornou a perguntar.
― O céu ― ela suspirou. ― Parece o céu de Saigon.
Ele sorriu também outra vez. E concordou:― Sim, é verdade. Parece o céu de Saigon.
Nesse momento ― dizem que cabe aos homens esse gesto, e eles eram mesmo meio antigos — talvez ele tenha pensado em oferecer um cigarro a ela, em perguntar se já tinha visto aquele filme, se queria tomar um café no Ritz, até mesmo como ela se chamava ou alguma outra dessas coisas meio bestas, meio inocentes ou terrivelmente urgentes que se costuma dizer quando um desses rapazes e uma dessas moças ou qualquer outro tipo de pessoa, e são tantos quantas pessoas existem no mundo, encontram-se de repente e por alguma razão, sexual ou não, pouco importa se por alguns minutos ou para sempre, tanto faz, por alguma razão essas pessoas não querem se separar. Mas como ele era mesmo sempre um tanto lento, não perguntou coisa alguma, não fez convite nenhum. Nem ela. Que lenta não era, mas apenas distraída. Ela então sorriu pela terceira vez, e já de costas abanou de leve a mão abrindo os dedos, como Sally Bowles em Cabaret, e continuou a descer a rua Augusta. Ele também sorriu pela terceira vez, meio sem jeito como era seu jeito, enfiou as mãos ainda mais fundo nos bolsos, como Tony Perkins em vários filmes, coçou a barba por fazer e resolveu subir novamente a rua…
(Enviado por Paloma Aime Ferreira)

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